quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Reinaldo e a defesa de Serra

Uma das (poucas) vantagens de se ler o blog de Reinaldo Azevedo é que ele não consegue ficar quieto nem quando mandam. Então ficamos sabendo antes qual será a linha de defesa do PSDB paulista e de José Serra. Isso vale para qualquer assunto e vale também, naturalmente, para o caso do livro da moda na blogosfera descolada nesse verão, "A Privataria Tucana".


Ainda sob a a vigência da lei do silêncio, imposta em uníssono pelas sagradas famílias da imprensa, Reinaldo não se conteve e redigiu um post tão raivoso quanto enigmático (pelo menos para quem não sabia do lançamento do livro). O texto é um longo libelo contra os "métodos da canalha", "um subjornalismo pendurado nas tetas do governo federal e das estatais", canalha esta que estaria ligada a "atos praticados por criminosos". Uma "escória" que, por ocasião do mensalão, inventou a tese do "golpe da mídia" e posteriormente se organizou em um "eixo criminoso" formado por "ex-jornalistas convertidos em lobistas", "negociantes", "esbirros de políticos", todos sustentados por dinheiro público.


Reinaldo então segue lembrando o "Dossiê Cayman", a caminho de uma falácia lógica muito utilizada na Internet, a falácia por associação. Nesse tipo de argumento falso usa-se uma propriedade comum de dois objetos para ligá-los e então igualar todas as suas outras propriedades. No caso atual, a ideia é que se o  "Dossiê Cayman" continha denúncias contra tucanos e era falso, então o livro de Amaury Jr., como contém denúncias contra tucanos, também é falso. Seus outros argumentos vão na mesma linha, lembrando outros casos famosos como o dos aloprados e a suposta quebra de sigilo fiscal de Serra ano passado.


O importante não são os argumentos de Reinaldo, mas sua repetição quase literal (mas em linguagem menos ofensiva, claro) nas notas emitidas dias depois por Fernando Henrique Cardoso e Sérgio Guerra. Observem que nem Reinaldo, nem Cardoso nem Guerra dizem qualquer coisa sobre o conteúdo do livro de Amaury Jr. Apenas se preocupam em atacar o autor, lembrar casos passados e reafirmar que as privatizações já foram investigadas e não se achou nada (aliás, o nome dessa outra falácia é a generalização apressada: se uma investigação não encontrou nada então todas as operações ligadas às privatizações foram corretas. E isso apenas se você considerar que o governo Lula teve em algum momento a intenção de investigar de verdade o processo de privatização desmonte do Estado do governo tucano).


Hoje Reinaldo reage ao pedido de CPI protocolado por Protógenes Queiroz e nos dá uma pista concreta sobre os próximos passos de Serra e seus defensores: a desqualificação da CPI e a tentativa de abafar o escândalo sob gritos de "perseguição política". Da mesma forma que inventaram em determinado momento que a democracia "exigia" a alternância de poder (e não apenas sua possibilidade), agora Reinaldo inventa que a CPI seria um instrumento exclusivo da minoria contra a maioria e portanto não pode ser utilizada para investigar a oposição ou qualquer de seus membros.


Isso é materialmente falso. A Constituição, no único parágrafo dedicado às CPIs (o parágrafo 3 do artigo 58), diz: "As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas mão Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores".


O que a Constituição faz não é tornar a CPI um instrumento exclusivo da minoria mas sim, ao pedir a assinatura de apenas um terço dos congressistas para a instalação de uma Comissão de Inquérito, tornar a CPI um instrumento também disponível para a minoria. Mas não para Reinaldo, que escreve: "CPIs são instrumentos das minorias, nunca das maiorias. E assim é por um motivo óbvio: se à maioria bastasse se reunir para “investigar” a oposição, convenham que se estaria no caminho de uma ditadura." (grifo meu) e também "Logo, temos algo além da simples intimidação: é mesmo uma tentativa de extermínio." 


Ou seja, nos próximos dias teremos líderes da oposição e jornalistas mais sérios e respeitáveis que Tio Rei (tais como nosso herói, Merval, o Imortal) clamando contra a "perseguição política" a Serra e seus familiares e a "intimidação da oposição". Mas duvido que cheguem a falar de extermínio, visto que a eliminação política de Serra interessa a largas faixas dessa mesma oposição.


[Em tempo: o argumento de Reinaldo, da CPI como instrumento da minoria, faz água por outro lado também, um imenso telhado de vidro representado pelo bloqueio de CPIs pelas maiorias alinhadas aos respectivos governadores do PSDB nas Assembléias Legislativas de São Paulo e Minas. Faz mais de uma década que a minoria não consegue instalar uma CPI sequer nesses estados.]


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